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Março Mulher: A história da diretora que comandou o Polivalente por mais de duas décadas e ganhou o carinho da população

Tereza Gesteira foi diretora do Polivalente por 22 anos e marcou gerações de estudantes. Até hoje sua forma de administrar inspira muita gente

27/03/2018 às 19h46 Atualizada em 25/04/2018 às 06h54
Por: Correio Fonte: Conteúdo Correio da Cidade
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Tereza Gesteira é a terceira homenageada na série de reportagens em comemoração ao mês da Mulher (Foto: Eric Gomes)
Tereza Gesteira é a terceira homenageada na série de reportagens em comemoração ao mês da Mulher (Foto: Eric Gomes)

A terceira entrevista da série em homenagem ao mês da Mulher é com a professora Tereza Gesteira, ou simplesmente Terezinha do Polivalente. Ela que marcou a vida de muita gente, foi uma das diretoras mais premiadas da história recente da educação local e acima de tudo, inspirou uma geração inteira de jovens. Muitas vezes severa como profissional, mas um coração gigante para quem trabalhou ou conviveu com ela, Tereza é uma referência em vários aspectos. O Correio da Cidade, orgulhosamente conta a história de uma mulher persistente, forte e dedicada que revolucionou a forma de fazer educação e cravou seu nome para sempre na história de Santo Estevão. 

Tereza Maria Silva Gesteira comandou o Colégio Polivalente de Santo Estevão por 22 anos e fez história como uma gestora de pulso firme, mas que soube com maestria, envolver a comunidade nos assuntos da escola. Sob sua gestão passaram mais de 20 mil alunos ao longo dos anos, inspirou gerações, firmou laços de confiança com as famílias dos seus alunos, cravando assim seu nome para sempre na história da cidade. 

Nascida em Santo Estevão, aos 11 anos foi conviver em um pensionato para estudar em Feira de Santana. A menina chamada de Terezinha começava ali a sua caminhada para logo mais, escrever para sempre sua história de transformação na educação de Santo Estevão. Aos 12 anos foi estudar em um colégio interno de Cachoeira, na Bahia. No colégio Santíssimo Sacramento passou 3 anos e só ia em casa a cada trimestre. “Era muito difícil estudar fora da cidade naquela época. A estrada para Feira de Santana não era asfaltada e em tempo de chuvas, demorava até 4 horas de viagem”, lembra. Nem a saudade de casa nem as dificuldades das viagens para estudar desestimularam a jovem Tereza. Segundo ela, foi daí que tirou toda força que a fez uma grande mulher. “A gente só se comunicava por cartas. Lembro que quando estudava em Cachoeira, era um feirante que levava as cartas de minha mãe”, conta. Após os três anos no colégio interno de Cachoeira, Tereza foi transferida para estudar na capital baiana. Em Salvador, sua moradia também eram os pensionatos. 

Retorno para Santo Estevão | Aos 17 voltou para Santo Estevão com o ensino médio completo. Começou então a dar aulas de reforço escolar em casa. Um ano depois, se inscreveu no concurso público para professores do estado e foi aprovada. 

Passou a ensinar no Colégio D. Pedro I e depois, a convite da secretaria estadual de Educação, assumiu temporariamente a direção do então colégio Municipal de Santo Estevão. Sua gestão escolar chamou tanto a atenção do governo que mais tarde iria ficar a frente de uma escola referência em ensino que estava sendo montada em todo o país. 

Foi aprovada no primeiro vestibular que fez na Faculdade de Educação – hoje Uefs – Universidade Estadual de Feira de Santana. O curso era o extinto Estudos Sociais, que englobava práticas de História e Sociologia, Filosofia. 

Em 72 recebe o convite que mudaria sua vida profissional | Quando já estava prestes a se formar, foi convidada para um novo curso superior, agora o de Administração Escolar para que assumisse a direção do Colégio Polivalente, um novo modelo de educação que seria instalado em 1972 em várias cidades brasileiras. Não parou os estudos e ingressou na Universidade Católica. 

Em 1974 foi vice-diretora do Polivalente de Feira de Santana. Mais tarde, o diretor daquela unidade seria Orlando Santiago, que antes dirigia o Polivalente de Gandu. Os dois formaram uma dupla de sucesso e logo foi transferida para o Polivalente de Santo Estevão. 

“Lembro que quando eu e Orlando viemos para a direção substituir o professor Cosme Castor Cerqueira, em pouco tempo a secretaria de Educação convidou Santiago para um cargo e foi aí que assumi a ponta da direção”, lembra. “Naquele momento de substituição ao cargo de diretoria que era de Orlando e a conjuntura que vivíamos no regime político me fez ser dura. Tinha que me impor”, avalia. 

 Educação em meio a  Ditadura Militar | As Escolas  Polivalentes  começaram a ser  construídas  no período da  Ditadura  Militar  no Brasil,  após  a  assinatura  dos  acordos MEC­-USAID, por meio dos  quais foram disponibilizados recursos financeiros, oriundos dos Estados Unidos, destinados à  educação brasileira. Portanto, a criação de tais escolas faz parte da reforma educacional  já prevista pela Lei nº 5.692/71, que reformulou os ensinos de 1º e 2º graus, tornando este  último obrigatório e  profissionalizante. Tereza conta que o sistema organizacional proposto para o  Polivalente era um modelo inovador de educação  muito complexo para administrar, por ser tudo uma grande novidade. Tinham três militares que cuidavam da gestão dos colégios, supervisionando. “Passamos dois anos tratando apenas com três comandantes da polícia militar sobre toda organização da escola”, relembra. Como era período da Ditadura, os militares  exerciam a influencia sobre os órgãos do Estado. Tereza conta que por muitas vezes chegou a dormir na escola para dar conta de tudo. “Como era a implantação de um novo método de ensino, o desafio era muito grande e eu tinha que me impor e acertar; eu não dava chances para erros”, avalia. 

 “Comecei então a ‘ser mão de ferro’ porque tinha que ter pulso forte para aquela escola dar certo. Com o passar dos anos fui vendo que rigidez não era tão importante e amoleci meu coração, porém jamais deixei de fazer tudo com muito zelo. O Polivalente sempre teve e ainda dispõe de profissionais dedicados, da portaria à direção até nas salas de aula"

Alta remuneração | Todos que assumiram a direção dos colégios Polivalente começaram a ser perseguidos politicamente. “A gente ganhava o equivalente a um juiz de Direito na época e isso despertou a ira de muitos gestores públicos. Chegaram a pedir minha cabeça de bandeja”, conta ao relembrar de quando a sociedade se manifestou com protestos de rua para sua permanência na escola. “Tinha um deputado que queria me transferir e durante a reunião deles, o enfrentei com argumentos e nunca mais eles mexeram em mim”, diz. “Falei para eles acabarem com aquele circo e me que demitissem porque eu não suportava mais tanta pressão. Eu não queria ser usada como jogo político e não permiti isso”. Conta Tereza, mostrando que sua personalidade forte foi decisiva para impor respeito naquele momento. 

Formato | O modelo educacional do Polivalente era composta por laboratório de Ciências, uma oficina e sala ambiente para Artes Industriais, uma sala para Educação para o Lar, uma para Educação Artística, um laboratório e oficina para práticas agrícolas; uma biblioteca ampla para leitura, com um acervo de mais de 5 mil livros. A nova proposta de estrutura educacional contava ainda com área para pessoal administrativo, zeladoria e cantina, uma sala de supervisão, uma sala de orientação, uma para diretores, uma para vice-diretores, uma para recursos didáticos, para professores e uma para almoxarifado Na aula de Educação para o Lar, mais escolhida pelas estudantes da época, era palco para grandes aprendizados na área de culinária. “Era lindo de ver os alunos nas aulas aprendendo a cozinhar, a lidar com um comércio ou mesmo cuidando da horta da escola”, relembra em tom de saudosismo. “Quando os alunos preparavam as guloseimas, convidávamos os professores e personalidades da cidade para apreciar e conhecer os talentos dos estudantes”, conta. 

Banda Marcial era atração para a cidade | Além das aulas diferenciadas, que contavam com os melhores professores da rede e um planejamento estratégico para uma eficiente aplicação dos métodos para os alunos, a escola tinha uma banda marcial. “No início tínhamos mais de 120 músicos e os que tinham perfil de liderança passaram a regentes da banda”, relembra do grupo que teve como instrutores musicais o professor Walter (de Feira de Santana), Nori Lopes e os irmãos Wellington, William e Alysson Ribeiro, todos de Santo Estevão. “Era uma disputa dos alunos para serem convidados a tocar na banda. Na época dos desfiles cívicos era uma euforia só para ver nosso grupo musical nas ruas da cidade”, conta. “Me recordo que começamos só com instrumentos percussivos. Depois chegaram os instrumentos de sopro, e por último um instrumento grego chamado Lyra, que foi manuseado exclusivamente por Hudson Ribeiro, estudante do Polivalente na época. Logo em seguida a banda se transformou em Fanfarra e passou a ser regida pelo maestro Gabriel até os dias de hoje”. 

Cadeira Macia | Tereza conta que a história da cadeira macia começou quando os alunos eram zombados pelos demais quando ela mandava chamar na direção para uma conversa disciplinadora. “Um deles, para não sair por baixo disse que não tinha nada demais em ir ser chamado atenção, pois o bom mesmo era passar a manhã inteira sentado em uma cadeira macia e confortável”, conta aos risos. A cadeira passou a ser um símbolo de temor e até de desabafo de várias gerações de alunos que passaram pelo Polivalente.

“Eu aconselhava mais do que punia. Nunca expulsamos alunos, sempre acreditei que trazê-lo para junto de nós seria o mais correto e isso funcionou muito bem”. Durante os 22 anos que comandou a escola, Tereza fez de lá um elo entre os alunos e os familiares de cada estudante. “Eu perdi as contas de quantas residências visitei para resolver não apenas questões de indisciplina dos alunos, como situações da vida particular deles. Todos recorriam a mim e aos professores”, avalia. 

 
Personagens que serão eternizados | “A gente exigia disciplina dos alunos desde a portaria sob o comando de Tia Lita, Corina e Silvino, até nas salas de aula. Todos os dias esse trio olhava rigorosamente o uniforme dos alunos para saber se estava tudo em ordem. Era disciplina em tudo. O sucesso do Polivalente está em tudo isso, essa magia de envolver pais, professores, funcionários e alunos, formando uma grande família. Acabamos sendo personagens da vida de muita gente”, relembra Tereza. “Se um aluno quebrasse qualquer coisa da escola, eu ia lá com ele medir tudo, avaliar, ia em uma casa comercial saber o valor e os pais pagavam. Caso o aluno não tivesse condições financeiras de arcar com o prejuízo, simplesmente a gente entrava em uma espécie de acordo de conduta onde ele tinha que melhorar seu comportamento e rendimento escolar como recompensa”. Ações simples como não deixar os alunos jogarem sequer um papel de bala no chão e ensinamentos muitas vezes severos de como zelar pelo patrimônio público faz do Polivalente, até os dias atuais, uma escola com nível de conservação surpreendente. 

Após sua saída do Polivalente, Tereza ainda foi secretária de Governo de Orlando Santiago, onde comandava a pasta de planejamento estratégico. 

Hoje, já aposentada, Tereza cuida de casa, em especial do jardim e de seu cão de estimação. Durante a entrevista ela apresentou seu jardim com plantas das mais variadas espécies, a piscina que mandou construir recentemente e a rede na varanda onde gosta de ler e usar a internet. “Sou conectada com o mundo. Pergunte o que quiser que responderei sobre política, economia, o que tiver acontecendo no mundo eu estou por dentro”, diz, ao frisar que adora saber das noticias via TV e internet. “Gosto demais de viajar, ir ao supermercado. Por onde passo encontro sempre um ex aluno que vem falar comigo. E olha que geralmente lembro de quem se trata e como e comportava na época que fui diretora. 

Matando a saudade | Todos os anos, ex e atuais funcionários se encontram numa grande confraternização. “Passamos um dia inteiro juntos. Almoçamos, relembramos dos casos e rimos demais. Tudo regado a muita comida e música ao vivo. Fiz do Polivalente minha segunda morada, não dá pra esquecer assim”, brinca. 

Colégio continua sendo referência | Após a gestão de Tereza Gesteira, assumiu o Polivalente, a professora Célia Rodrigues e em seguida, Luziane Bastos. Em 2008, a direção do colégio foi assumida pela professora Antonia Ailda Magalhães, que permanece até hoje. A unidade de esino, que hoje abriga mais de 1.200 alunos matriculados no Ensino Médio, batizou o auditório com o nome de Tereza Gesteira, em sua homenagem. “O auditório era um sonho de Tereza e resolvemos batizá-lo com o nome da professora que é ícone para nosso colégio”, disse a vice-diretora Maricleia Ribeiro. 

O Polivalente continua sendo referência em educação, além de liderar o número de alunos aprovados em vestibulares e acima de tudo, um marco para a educação de Santo Estevão e região. 

 Reportagens especiais do MARÇO MULHER:

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