Reconhecer a criança como sujeito de direito em condição de desenvolvimento deve constituir a base da educação, defenderam participantes de debate sobre educação parental na Câmara dos Deputados. Conforme ressaltou a presidente da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, Mariana Luz, até os seis anos de idade ocorre a formação de 90% do cérebro de uma pessoa. Essa fase, segundo afirma, determina aspectos físicos e emocionais e interfere até mesmo no surgimento de doenças crônicas futuras.
O sucesso da educação, principalmente nesse período inicial de desenvolvimento, depende, segundo os debatedores, do que chamam de “parentalidade positiva”. Uma educação baseada no afeto, sem a presença de agressões, principalmente físicas. Para isso, os especialistas também frisaram ser indispensável a estabilidade emocional dos pais.
No Brasil, ao contrário do que preconizam os estudos, segundo os debatedores, ainda permanece a cultura da educação pelo castigo. A professora de pós-graduação em saúde mental da Universidade de São Paulo Elisa Altafim relatou que pesquisa coordenada por ela no Ceará mostrou que 67% das mães utilizam a palmada como forma de disciplinar os filhos. Segundo afirma, essas “práticas negativas” decorrem, em grande medida, de sobrecarga dos cuidadores e ausência de apoio à estrutura familiar.
Como ressaltou o deputado Pastor Henrique Vieira (Psol-RJ), em uma sociedade marcada por desigualdades, como a brasileira, se faz realmente necessário rever muitos aspectos sociais para se falar em estabilidade emocional dos pais. E não só os fatores econômicos interferem no debate, afirma Henrique Vieira, um dos autores de pedido para realização da audiência pública na Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família.
O deputado sustenta que aspectos como “a cultura do patriarcado”, que levariam a problemas como feminicídio, cultura do estupro e violência doméstica, também contribuem para a destruição do ambiente familiar e têm consequências sobre crianças e adolescentes.
“Proteger a família é, no limite, garantir moradia, emprego, renda, saneamento básico, acesso à saúde, porque isso também compõe e constitui o cuidado com as famílias concretas, não exclusivamente, entende? Mas, sem esses fatores, como pensar estabilidade emocional diante de uma criança vendo a mãe violentada? Como pensar estabilidade emocional com o estômago roncando por conta da fome ou da subnutrição?”, questiona.
De acordo com Mariana Luz, os estudos dão razão ao deputado e mostram que, quanto maior a situação de pobreza e vulnerabilidade, menor a “parentalidade positiva”. E ela destacou que, das 20 milhões de crianças na primeira infância no Brasil, um terço vive em situação de pobreza ou de extrema pobreza.
Apoio às famílias
Autora do outro requerimento para a realização do debate, a deputada Franciane Bayer (Republicanos-RS) frisou que, conforme a Constituição, a família representa a base da sociedade. Na concepção da deputada, o papel do poder público deve ser o de oferecer apoio para o núcleo familiar cumprir seu papel educacional.
“É cada vez mais comum vermos inimigos da família fingindo se importarem com as crianças, militando para que o poder público interfira até mesmo na religiosidade e na sexualidade dos nossos pequenos. Ou seja: não basta que o Estado tenha o monopólio absoluto da transmissão de conhecimento aos pequenos, é o que querem os que têm a absurda posição contrária ao ensino domiciliar e à participação dos pais na educação dos filhos.”
Papel da escola
Já para o Pastor Henrique Vieira, o mais importante é pensar a escola na perspectiva da comunidade escolar, que envolve professores, funcionários, o território onde se localiza e as famílias.
“Eu tenho muita preocupação com uma certa [perspectiva] antiescola. Eu concordo com a deputada sobre a importância complementar da família na educação, mas eu tenho muito medo de uma linha home schooling que esvazie o sentido da escola, quando muitas vezes é em casa que a criança sofre violência e é na escola que a violência é descoberta”, salientou.
Segundo o diretor-executivo da Associação de Desenvolvimento da Família, Rodolfo Barreto Canônico, o Brasil regista 40 mil casos de crianças vítimas de violência doméstica por ano, mesmo com subnotificação. E, segundo ele, a maior parte das violações ocorre na família.
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