Especialistas em saúde defenderam o fim do financiamento público às comunidades terapêuticas destinadas à reabilitação de dependentes químicos. As afirmações foram feitas em debate realizado nesta quarta-feira (17) na Comissão de Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família
da Câmara dos Deputados.
Conforme levantamento do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, nos últimos cinco anos, houve aumento de 182% nas emendas parlamentares destinadas a essas instituições. Em 2020, foram destinados R$27,8 milhões; em 2021, o montante saltou para R$40,5 milhões; em 2022, R$36,4 milhões; em 2023, R$53,6 milhões (até maio).
Para participantes do debate, no entanto, o acréscimo de dinheiro público não resultou em melhor eficiência no tratamento da saúde mental. “Ao longo destes últimos cinco anos não tivemos melhora de nenhum indicador na área de saúde mental. Durante esse período, houve aumento do uso de álcool e de drogas e de taxas de suicídio”, disse o representante do Ministério da Saúde, Marcelo Kimati.
Para o psiquiatra, é preciso pensar em um modelo flexível para atender os usuários de drogas, que acompanhe a pessoa ao longo do tempo necessário a sua reabilitação. Segundo Marcelo Kimati, a criação de novos leitos hospitalares não resolve o problema dos mais de 15 milhões de brasileiros que vivem nessa situação.
Fiscalização
A atual rede de apoio aos usuários de álcool e outras drogas financiada pelo poder público é formada pela iniciativa privada, com a atuação das comunidades terapêuticas; e pelo SUS, por meio de unidades de acolhimento e centros de atenção psicossocial.
Para a representante do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS), Dayana Rosa, um dos principais problemas de se manter comunidades terapêuticas na rede pública é a precariedade de fiscalização.
Em levantamento feito pelo IPEPS, entre 2017-2022, nos contratos da parceira público-privada foi identificado que a fiscalização ficava a cargo de conselhos (nacionais, estaduais e municipais) sem que houvesse a presença da sociedade civil, ou era terceirizada para outra empresa privada.
Para Dayana Rosa uma possível solução seria concentrar esse tratamento no SUS, desabilitando as comunidades de pactuar com poder público. “No SUS, a gente consegue controle social, transparência, consegue observar os direitos humanos, fortalecê-los e até aumenta-los. Conseguimos, mais de que tudo, a liberdade", disse.
Para a deputada Cristiane Lopes (União-RO), no entanto, as comunidades são parte importante no tratamento de dependentes químicos e devem ser financiadas. “A grande diferença entre os senhores (especialistas) e para quem cuida das comunidades terapêuticas é que os senhores falam de teoria, de protocolos, enquanto eles falam da prática, do cuidado”, disse.
Liberdade religiosa
Durante a audiência, a prática de doutrinamento religioso dos internos por essas instituições foi o tema que gerou controvérsia entre os deputados.
Para o deputado Pastor Eurico (PL-PE), favorável ao trabalho das comunidades, a prática não é contrária ao direito de liberdade religiosa. “São instituições sérias que tem o cunho cristão”, disse.
Já o Pastor Henrique Vieira (Psol-RJ), que solicitou o debate, acredita que outras formas de cultuar a religiosidade devem ser ofertadas aos pacientes. "É preciso aceitar a diversidades”, rebateu.