Ivanildo de Medeiros Oliveira nunca deixou que a surdez fosse um limite para ele. Quando ainda criança começou a ser revelado seu talento pela pintura e no ensino médio lutou para que a escola contratasse professor intérprete. Hoje, o jovem de 22 anos está no terceiro semestre do ensino superior e quer fazer mais um curso, dessa vez, de artes.
Ivanildo viu na arte a sua grande possibilidade de inclusão social. Através de suas pinturas em tela, achou um novo caminho para a comunicação, se qualificou e ganha dinheiro vendendo quadros.
A entrevista foi intermediada pela intérprete de Libras Jamile Ferreira e acompanhada por Leo Medeiros, amigo que aprendeu a leitura de sinais para ficar mais próximo de Ivanildo.
A surdez não foi capaz de limitar o jovem, que revela ter muito que conquistar ainda. Com perfil de característica independente, foi ele um dos líderes responsáveis pelo ensino de libras está presente nas escolas do ensino médio em Santo Estevão.
Aos 7 anos de idade, Ivanildo ganhou da irmã alguns materiais de pintura. E foi a partir daí que sua vida se transformou. Aos 14 anos, a mãe percebeu que o filho tinha o dom da pintura e o matriculou num curso com Joel Silva, artista local. Logo, o jovem surpreendeu ao professor e colegas pelas suas habilidades artísticas. Ivanildo ficou no curso por três anos e hoje desenha e faz pinturas que arranca elogios até de críticos.
Para não dar chances à solidão, o jovem passou a dividir todo o tempo entre os estudos e a pintura.
O artista começou a publicar suas pinturas na rede social e logo começaram a chegar clientes querendo auto-retratos, quadros com paisagens... e assim ele consegue, mesmo sendo pouco, ganhar dinheiro.
No ano passado, Ivanildo entendeu que precisava se qualificar ainda mais e procurou um curso de artes no Cuca – Centro Universitário de Cultura e Arte. Ele conta que a aprendizagem deve ser encarada como um processo permanente, por toda a vida.
Os desafios na educação | Até a 5ª série Ivanildo se sentia isolado da vida escolar, pois não tinha tido até então nenhum intérprete de libras nas salas de aula. Ele explica que só aprendia Matemática por conta dos símbolos e devido à dificuldade de compreensão das outras áreas de conhecimento, tinha baixos rendimentos na escola.
Até essa fase, ele não se comunicava nem com professores, nem alunos. Ivanildo vivia um momento de isolamento, mesmo que não intencional. Na 6ª série ele conseguiu uma vaga na escola municipal Marizélia de Jesus Rocha Leal (antiga Maria Irene), onde tinha uma intérprete e foi aí que ele deslanchou rapidamente nos estudos.
Quando chegou ao ensino médio, mais uma vez se deparou com a ausência de um profissional que o ajudasse em sala de aula. Juntou com outros três colegas surdos da mesma escola e decidiram não assistir aula até que a direção do Colégio providenciasse um intérprete. Em duas semanas, o profissional foi contratado pelo governo do estado. Na mesma escola, Ivanildo foi destaque em Redação, com notas acima de 8,5.
Ensino superior – O jovem está no terceiro semestre do curso superior de Letras Libras e sonha em ser professor. Ele quer voltar para a sala de aula e ensinar outros surdos, montar uma associação que ajude pessoas que passam pela mesma situação que ele e fazer chegar o serviço de intérpretes a hospitais, postos de saúde, bancos e muito mais. Ao concluir o curso superior, Ivanildo quer fazer uma segunda faculdade, dessa vez de Artes Plásticas.
Sozinho, Ivanildo correu atrás do Passe Livre e hoje viaja sem custo algum até para fora do Estado. Também conseguiu um aparelho auditivo, mas se recusa a usar. “Com o aparelho ele só escuta ruídos. Ivanildo aceitou muito bem a sua condição e tem orgulho de ser surdo, ele ama a linguagem de sinais, por isso evita o aparelho”, contou a intérprete Jamile. “Ele é um menino impressionante. É independente, corre atrás de seus sonhos, é dedicado e extremamente disciplinado. Ivanildo ainda vai longe”, conta orgulhosa a intérprete, que acompanha Ivanildo sempre que ele precisa. “A gente se apega aos nossos alunos ainda mais quando sentimos essa determinação”, disse.
Jamile conta que Ivanildo assumiu um papel importante na sociedade quando ele decidiu não ser vítima de sua condição. “Ele não quer se tornar um ouvinte. Ele compreendeu muito bem, assimilou com naturalidade que a língua materna dele é a de sinais”.
O amigo do peito | Leo Medeiros é amigo de Ivanildo há alguns anos, mas foi recentemente que aprendeu a linguagem de sinais para facilitar ainda mais a comunicação entre os dois. “Antes, quando a gente saía, a comunicação era por mensagens de celular. Aquilo me incomodava e percebia que o deixava sem jeito e foi aí que Ivanildo passou a me ensinar a linguagem de sinais. Além do que ele me ensinou, eu procurei pesquisar e avancei nesse campo”, conta Leo Medeiros, que hoje se comunica de forma fluente com o amigo.
Na última semana de aula no ensino médio, Ivanildo surpreendeu um professor ao pedir para baixar um aplicativo do Bradesco que ensina libras. Ao professor, o jovem sugeriu que aprendesse duas palavras: ‘professor’ e ‘amigo’. Para os professores da época, aquele gesto de Ivanildo revela toda a sua vontade de viver num mundo com mais interação entre todos, sem diferenças.
Abaixo, imagens de quadros pintados pelo jovem Ivanildo Medeiros:
Reportagem |Alysson Ribeiro | Correio da Cidade
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