A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou nesta quarta-feira (15) projeto de lei que cria normas para a elaboração de planos de adaptação à mudança do clima. A proposta ( PL 4.129/2021 ) foi analisada pelo colegiado após acordo negociado entre o governo e a oposição na terça-feira (14). O texto segue agora para a análise do Plenário.
De autoria da deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP), o projeto estabelece as diretrizes gerais a serem seguidas pelos órgãos do Sistema Nacional de Meio Ambiente nos planejamentos para reduzir a vulnerabilidade em relação à mudança do clima nos sistemas ambiental, social e econômico. O objetivo do texto é complementar a Lei 12.187, de 2009 , que estabeleceu a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC).
O PL 4.129/2021 estava na pauta do Plenário na terça-feira, mas senadores da oposição pediram mais tempo para análise. Conforme a negociação feita, após a votação na CCJ, foi acordado o retorno imediato do texto para o Plenário ainda nesta quarta-feira.
Líder do governo no Senado, o senador Jaques Wagner (PT-BA) foi o relator do projeto na CCJ. Ele acolheu parcialmente uma emenda sugerida pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). O trecho acatado, segundo o relator, visa “garantir efetiva participação do setor empresarial na formulação e implementação do plano nacional de adaptação”.
— O mais importante que eu queria era isso: que o setor privado tivesse sentado à mesa desde a concepção das diretrizes que vão determinar para onde vão os recursos, qual vai ser a legislação que será aplicada e quem serão os atores envolvidos. Porque no fim das contas, as sanções que podem vir, os impactos do que está sendo criado aqui por essa lei atingirão diretamente os empresários — afirmou Flávio.
Na reunião, o senador Esperidião Amin (PP-SC) elogiou a emenda acatada, mas questionou trechos do projeto. Para ele, o PL deveria indicar de forma mais clara os responsáveis diretos pelas ações e também as fontes de recursos para a eventual elaboração dos planos estaduais, municipais e distrital. Na mesma linha, o senador Sergio Moro (União-PR) avaliou que o projeto é “simbólico” e não resolve os problemas práticos dos efeitos da mudança climática.
— Isso não fixa direito nenhum, obrigação nenhuma, é uma proclamação. Ou seja: eu não vou negar, vou subscrever a proclamação, mas dizer que isso vai ser uma lei que vai estabelecer um plano nacional de defesa contra a mudança climática, eu faço ressalva — afirmou Esperidião Amin.
O projeto foi aprovado na comissão com votos contrários dos senadores Carlos Portinho (PL-RJ), Mecias de Jesus (Republicanos-RR), Rogério Marinho (PL-RN), Flávio Bolsonaro (PL-RJ), Eduardo Girão (Novo-CE), Plínio Valério (PSDB-AM) e Hamilton Mourão (Republicanos-RS).
A CCJ também aprovou o regime de urgência para análise do texto no Plenário, conforme o acordo estabelecido. Anteriormente, no fim de fevereiro, o projeto foi aprovado na Comissão de Meio Ambiente (CMA) com voto favorável do relator, senador Alessandro Vieira (MDB-SE), que apresentou um substitutivo ao texto original da deputada Tabata Amaral (PSB-SP).
Pelo texto aprovado, os planejamentos devem ter medidas para integrar a gestão do risco da mudança do clima aos planos e políticas públicas setoriais existentes e às estratégias de desenvolvimento local, estadual, regional e nacional. Além disso, as ações de adaptação devem estar ligadas aos planos de redução de emissão dos gases de efeito estufa.
As principais diretrizes para os planos são o enfrentamento dos efeitos atuais e esperados das alterações climáticas; a criação de instrumentos econômicos, financeiros e socioambientais que permitam a adaptação dos sistemas naturais, humanos, produtivos e de infraestrutura; e a integração entre as estratégias locais, regionais e nacionais de redução de danos e ajuste às mudanças.
A proposta obriga ainda o alinhamento dessas estratégias ao Acordo de Paris sob a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, assinado em 2015.
No setor agropecuário, o texto prevê estímulos à adaptação do setor ao Plano ABC, que integra a PNMC e é voltado à economia de baixa emissão de carbono na agricultura. Tais estímulos deverão envolver investimentos em pesquisa ou na implementação de práticas e tecnologias ambientalmente adequadas.
A proposta prioriza as áreas de infraestrutura urbana e direito à cidade e de infraestrutura nacional. Nesses campos, estão inclusos a segurança alimentar e hídrica, a saúde, a educação e estruturas de comunicações, energia, transportes e águas. Também terão de estar nos documentos medidas para enfrentar os desastres naturais mais recorrentes e diminuir a vulnerabilidade rural e urbana nos âmbitos local, estadual, regional e nacional.
Os planos deverão ainda ser integrados à Política Nacional de Proteção e Defesa Civil ( Lei 12.608, de 2012 ) e à Estratégia Nacional de Segurança de Infraestruturas Críticas. O substitutivo estabelece que as ações deverão ser avaliadas, monitoradas e revisadas a cada quatro anos — no projeto original, esse prazo era de cinco anos.
Segundo o texto aprovado, os planos nacional, estaduais e municipais deverão ser disponibilizados na internet. Outra alteração feita pelo substitutivo aprovado na CMA e na CCJ ressalta que as ações serão embasadas por evidências científicas, análises modeladas e previsões de cenários.
O governo federal terá que elaborar um plano nacional de adaptação à mudança do clima em articulação com estados e municípios e os setores socioeconômicos, garantida a participação dos mais vulneráveis aos efeitos adversos dessa mudança e da sociedade civil.
O plano nacional deverá indicar diretrizes para a elaboração dos planos estaduais e municipais, assim como estabelecer ações e programas para auxiliar os entes federados na formulação e na implementação dos seus próprios documentos. Essa implementação poderá ser financiada pelo Fundo Nacional sobre Mudança do Clima.
Por fim, o plano deve prever cooperação internacional bilateral, regional e multilateral para o financiamento, a capacitação, o desenvolvimento, a transferência e a difusão de tecnologias e processos para a implementação de ações de adaptação, incluídos a pesquisa científica, a observação sistemática e o intercâmbio de informações.
Os planos deverão priorizar populações, setores e regiões mais vulneráveis e expostas a riscos climáticos. Critérios étnicos, raciais, de gênero, idade e condição de deficiência também deverão ser considerados na elaboração e implementação de medidas de adaptação ao clima, estabelece o projeto.
Em seu relatório, Jaques Wagner menciona as fortes chuvas e enchentes que atingem o Rio Grande do Sul desde o início de maio. Ele afirma que a situação no estado gaúcho é um exemplo dos eventos climáticos extremos que têm ocorrido em todo o mundo.
“Pode-se afirmar que o evento catastrófico que observamos no Rio Grande do Sul é resultado da responsabilidade compartilhada entre os maiores emissores de GEE [gases do efeito estufa] mundiais, sobretudo a partir de combustíveis fósseis, ao longo da série histórica desde o início do período industrial. Seria ingênuo acreditar que esse desastre foi causado apenas pela ação humana dentro do território brasileiro”, diz no parecer.
O senador Marcos Rogério (PL-RO) afirmou ser necessária “cautela” para análise do tema das mudanças climáticas. Segundo ele, o projeto aumentará e centralizará competências no Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).
— Toda vez que o Parlamento legisla no calor dos fatos, dos acontecimentos, nós retrocedemos no marco normativo, no marco legal. Você não pode legislar matérias complexas que terão impacto lá na ponta sob estado de violenta emoção. E nós estamos diante desse quadro. Estamos todos impactados pelo que está acontecendo no Rio Grande do Sul — disse.
De acordo com o balanço das enchentes no Rio Grande do Sul, divulgado às 12h desta quarta-feira pela Defesa Civil, as fortes chuvas atingiram 449 municípios e afetaram 2,1 milhões de pessoas. Foram registradas 149 mortes e 806 feridos. Mais de 538 mil pessoas estão desalojadas.
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