Por 61 votos favoráveis e nenhum contrário, o Plenário aprovou nesta quarta-feira (15) o projeto que suspende os pagamentos de 36 parcelas mensais da dívida do Rio Grande do Sul com a União. O dinheiro será aplicado em ações de enfrentamento da situação de calamidade pública provocada pelas chuvas nas últimas semanas. O texto dependia da aprovação da maioria absoluta dos senadores, ou seja, no mínimo 41 votos. A matéria, que tramitou em regime de urgência, será agora encaminhada à sanção presidencial.
Embora o texto tenha surgido para esta situação específica das enchentes no RS, a mudança beneficiará qualquer ente federativo em estado futuro de calamidade pública decorrente de eventos climáticos extremos, após reconhecimento pelo Congresso Nacional e por meio de proposta do Executivo federal.
De autoria do Poder Executivo, o Projeto de Lei Complementar ( PLP 85/2024 ) foi relatado pelo senador Paulo Paim (PT-RS), que apresentou voto favorável à proposição. Paim fez apenas um ajuste na redação, omitindo o termo “das referidas parcelas" do artigo 2º da proposição, “para evitar duplicidade de entendimento, dado que a intenção do projeto, desde o início, era a redução das taxas de juros nos contratos de refinanciamento, ou seja, dos valores incidentes sobre o saldo devedor da dívida", conforme explicou Paim em Plenário.
— É um momento muito triste para o Brasil e o Rio Grande do Sul. Oitenta por cento das cidades do Rio Grande do Sul foram atingidas. Não há uma única família de gaúchos que não esteja chorando pelos mortos ou pelos amigos [atingidos]. Apelo aos senadores que construamos um entendimento possível para que o projeto não volte para a Câmara. A expectativa é muito grande no Rio Grande do Sul. Quatrocentas e quarenta e nove cidades do Rio Grande do Sul foram atingidas por essas enchentes, por essa destruição. Unidos vamos superar essa tragédia e reconstruir um futuro melhor para todos — pediu Paim.
Após a votação do texto principal, os senadores rejeitaram destaque apresentado pelo PL para anistiar a dívida do Rio Grande do Sul. Ao pedir apoio para a emenda, de autoria do senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS), o senador Carlos Portinho (PL-RJ) disse que o Rio Grande do Sul “é terra arrasada”, o que exige uma solução “excepcional”.
— Não dá para entregar com uma das mãos e tomar lá na frente com a outra. A gente vai afogar o Rio Grande do Sul em empréstimos, é um caso excepcional, tem que ser tratado de modo excepcional, não dá para tomar com a outra mão lá na frente — reforçou Portinho.
O relator defendeu a rejeição do destaque pela premência da matéria e para que o texto não retornasse à Câmara, onde foi aprovada na terça (14), sob a relatoria do deputado Afonso Motta (PDT-RS). O deputado fez pequenos ajustes na redação original, mantidos no texto aprovado no Senado.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, também manifestou posição contrária ao destaque apresentado pelo PL. Ele explicou que as discussões vão avançar com o Ministério da Fazenda, no sentido da adoção de novas medidas em benefício do povo gaúcho.
— Desde o momento da tragédia, progressivamente medidas vêm sendo tomadas em solidariedade ao povo gaúcho, com sentimento de responsabilidade que deve se impor ao Executivo e ao Legislativo. O projeto de lei complementar foi uma medida muito bem reconhecida e aceita, algo que neste primeiro momento soluciona de maneira muito efetiva o problema da dívida do Rio Grande do Sul — afirmou.
Pacheco disse ainda que a ideia da anistia “pode ser apreciada em algum momento”, acrescentou que medidas emergenciais vêm sendo anunciadas pelo governo e efetivadas. Ele ressaltou que deverão ser anunciadas medidas em favor dos empresários gaúchos e sugeriu a adoção de medidas similares àquelas adotadas na pandemia, como a prorrogação de dívidas, manutenção de empregos e ajuda para pequenas e médias empresas.
— O fato é que até aqui o que se tem é uma soma de medidas com valores muito robustos para socorrer o Rio Grande do Sul e pode ser que isso não seja suficiente. O que vejo é um absoluto compromisso do governo federal para todas e quantas medidas forem necessárias para mitigar o reflexo das tragédias no Rio Grande do Sul. Estamos todos irmanados nesse propósito. Nesse momento temos acordo e limites de atuação, não pode haver divergências ideológicas e interesse eleitoral — afirmou.
O PLP 85/2024 estabelece que, na ocorrência de eventos climáticos extremos dos quais decorra estado de calamidade pública reconhecido pelo Congresso Nacional, mediante proposta do Poder Executivo federal, em parte ou na integralidade do território nacional, fica a União autorizada a postergar, parcial ou integralmente, os pagamentos devidos, incluídos o principal e o serviço da dívida, das parcelas vincendas com a União dos entes federativos afetados pela calamidade pública. Também poderá reduzir a zero por cento, nos contratos de dívida dos referidos entes com a União, a taxa de juros pelo período de até 36 meses, nos termos estabelecidos em ato do Poder Executivo federal.
— O projeto apresenta resposta deste Parlamento à sociedade quanto a uma das maiores tragédias já ocorridas na história do Rio Grande do Sul e [possivelmente] do Brasil. Ela promove regime de exceção, que excetua a referida norma das vedações ao aumento de despesas constantes das normas orçamentárias e fiscais em vigor. A proposta não somente suspende os pagamentos das dívidas por até 36 meses, mas também permite a redução das taxas de juros para zero por cento, facilitando que esses recursos sejam utilizados em ações críticas como a reconstrução de infraestrutura, o financiamento de força de trabalho temporária e o suporte para a retomada das atividades econômicas locais — afirmou Paim.
O projeto exige que os entes federativos afetados submetam um plano de investimentos detalhado ao Ministério da Fazenda, garantindo que os recursos sejam utilizados de maneira transparente e eficaz. Esse plano deverá ser acompanhado de supervisão rigorosa e de prestação de contas, assegurando que cada real seja aplicado diretamente nas necessidades urgentes da população. O texto também propõe ajustes nas Leis Complementares 101, de 2000, e 159, de 2017, visando facilitar a contratação de operações de crédito por entes em Regime de Recuperação Fiscal.
— Tais ajustes são essenciais para que, mesmo em tempos de recuperação, esses entes possam continuar investindo no bem-estar de suas populações sem comprometer seus limites fiscais ou a sustentabilidade de suas finanças a longo prazo. Em suma, a aprovação deste projeto de lei é crucial não apenas para mitigar o impacto das calamidades recentes, mas também para fortalecer a resiliência de nossos irmãos gaúchos, e de todos os entes federativos que, doravante, venham a passar por adversidades — disse Paim.
Líder da oposição, o senador Rogério Marinho (PL-RN) defendeu a restrição das operações previstas no projeto às áreas de calamidade, e não a todo o país.
— Nesse momento a palavra mais importante é solidariedade e agilidade. Temos que ter sentimento de união e unidade. Num futuro próximo, o governo terá que tomar outras medidas, temos praticamente a economia paralisada, há empresas submersas sem nenhuma condição de funcionamento — afirmou.
O senador Efraim Filho (União-PB) disse que é necessário que o governo ofereça um “colchão de garantias”, como um fundo garantidor, para que as operações de créditos das empresas, hoje fechadas, tenham condições de obter crédito.
O senador Esperidião Amin (PP-SC) manifestou apoio ao projeto, mas disse que o texto “está desequilibrado, porque ele é autorizativo e a redução de juros é aleatória”.
— Vou votar a favor,. Mas como teremos outras negociações a fazer com outros estados, não podemos deixar no aleatório esta delegação de competência para reduzir juros. Estamos autorizando uma postergação de R$ 11 bilhões de principal e, no mesmo período, os encargos financeiros são maiores, vai ficar devendo a mais, ou seja, é uma postergação em que a taxa de juros não deveria ficar aleatória — afirmou.
O senador Omar Aziz (PSD-AM) manifestou preocupação, visto que muitos cidadãos comuns foram ao banco contrair empréstimos e estão pagando juros, diante de eventuais dúvidas quanto à manutenção de seus empregos.
— Era importante conversar com a Febraban [Federação Brasileira de Bancos]; tínhamos que englobar outras questões futuramente para cuidar dessas pessoas — afirmou.
Líder do governo no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP) defendeu o projeto.
— O artigo segundo do projeto traz duas questões centrais. O que estamos aprovando aqui é para a nova realidade que estamos vivendo. A União fica autorizada a postergar os pagamentos devidos, reduzindo os juros a zero. Esta preocupação está contemplada na inteligência do artigo segundo do projeto — afirmou.
O senador Ireneu Orth (PP-RS) saudou a apresentação do projeto, mas ressaltou que a iniciativa privada precisará de muito auxilio para a reconstrução. Em resposta, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, disse que encaminhou ao governo federal reivindicação para inclusão de bancos cooperativos e do Banrisul, visto que a capilaridade da destinação dos recursos contempla os bancos oficiais de primeira linha.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) defendeu alteração do mérito do projeto para conceder a anistia total, em vez da suspensão da dívida do Rio Grande do Sul.
O senador Cid Gomes (PSB-CE) afirmou que o projeto reconhece as tragédias climáticas e assegura a todos os entes federativos o reconhecimento de estado de calamidade pública indicado pelo Executivo e aprovado pelo Congresso Nacional.
— Estamos tendo aqui uma política definitiva para tragédias provocadas por mudanças climáticas — afirmou.
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