Afastado em maio do cargo de senador da República, Aécio Neves mal saía de sua casa em Brasília, no Lago Sul, onde mora com a mulher, Letícia, e seus dois filhos. Além da família, só quem privava de sua intimidade eram alguns amigos e correligionários. Viajava pouco e, quando o fazia, evitava vôos comerciais. Vinha dedicando-se à sua estratégia de defesa e a retirar a irmã Andrea Neves da prisão preventiva. Após a temporada de desalentos, o jogo começou a virar para o tucano. Se não executou uma guinada de 180 graus, ao menos ganhou um importante fôlego. Na última semana, comemorou a decisão do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizando seu retorno ao Senado. Ato contínuo, subiu à tribuna da Casa dizendo-se arrependido por ter se deixado “enganar” pela “trama ardilosa” do empresário Joesley Batista, da JBS. Na quinta-feira 6, depois de uma articulação envolvendo até integrantes do PT, conseguiu se livrar de encrencas no Conselho de Ética. O colegiado decidiu arquivar o pedido de cassação de seu mandato. Agora, o senador pretende imprimir novos rumos ao barco agitado que foi sua vida.
O objetivo mais premente será enfrentar os seis inquéritos e a denúncia em tramitação contra ele no STF. Todos os esforços estão empenhados no sentido de permanecer como ficha-limpa, pois seu mandato termina em 2018, e ele quer concorrer a uma nova cadeira: a de deputado federal por Minas Gerais. Aécio, que quase se elegeu presidente da República em 2014, obtendo 48,3% dos votos no segundo turno contra Dilma Rousseff, está convencido de que não tem mais condições de ser conduzido ao Senado. Por isso, alimenta planos mais modestos. Antes mesmo da delação de Joesley Batista, pesquisas encomendadas pelo senador já apontavam o desgaste de seu nome. De acordo com os levantamentos, em meio a suspeitas de caixa dois, o tucano acabou entrando para o rol de políticos que passaram a ser rejeitados pela população – por mais que lutasse para tentar demonstrar a diferença entre doação não declarada para campanha e recebimento de propina.
Inflexão
Por isso, além de rebaixar um degrau em sua trajetória política, a partir da decisão de concorrer à Câmara, Aécio também pretende promover uma inflexão em seu modo de atuação. Segundo interlocutores, o Aécio combativo sairá de cena para dar lugar ao político “paz e amor”. A raiz dessa nova roupagem é o instinto de preservação. A ideia é manter a discrição, submergir por um tempo e evitar embates acalorados capazes de lhe criar embaraços.
Não significa, porém, que o tucano tenha perdido a ascendência sobre o PSDB, nem que ele vá abrir mão de suas prerrogativas. Dessa forma, até agosto, quando terminar o recesso, a intenção é que nada mude: ele se manterá na condição de presidente licenciado do PSDB e o senador Tasso Jereissati (CE), como interino. Apesar dos percalços, Aécio ainda é, entre as lideranças do PSDB com alcance nacional, aquele que possui mais laços com o tucanato. Mesmo debilitada, a proverbial capacidade de articulação política de Aécio joga a seu favor na correlação de forças interna. Os tucanos ainda reconhecem nele, enquanto presidente da legenda, características das quais seus antecessores se ressentiam. Sobretudo no que diz respeito à combatividade ao PT, ao poder aglutinador, refletido inclusive no time de colaboradores que montou, e ao resgate de bandeiras históricas do PSDB, em especial a do liberalismo econômico. Para aliados, a despeito da escalada desfavorável, nem tudo está perdido. O tempo dirá.
O itinerário do tucano
• O senador Aécio Neves (PSDB-MG) responde a seis pedidos de investigação no STF por ter tido seu nome envolvido em delações premiadas da Odebrecht e da JBS
• Em junho último, a Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu que o STF abrisse novo inquérito contra ele por corrupção e obstrução de Justiça no caso da JBS
• Aécio foi gravado pelo dono da JBS, Joesley Batista, pedindo R$ 2 milhões para pagar advogados
• A PGR pediu que o senador fosse preso e afastado do cargo. Aécio ficou suspenso do Senado por um mês, mas já foi autorizado pelo STF a voltar à função. O pedido de prisão ficou para ser analisado em agosto
• Ele foi afastado da presidência nacional do PSDB
• O Conselho de Ética do Senado arquivou a petição de cassação de seu mandato
• Deve ser candidato a deputado federal por MG
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